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quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Pensando o Brasil: alienação ou defesa?

Hoje amanheci pensando o Brasil.  Daí, me propus a escrever minhas elocubrações matinais, firmemente disposto a abandonar qualquer chavão. Sei que estamos cansados das teses históricas, do pensamento colonizado, das teorias de distribuição de renda, todas essas linhas de investigação que, se já não foram esgotadas, encontram-se perfeitamente abastecidas intelectualmente.
Eu ressinto os vieses analíticos que buscam a gênese da nossa trajetória social, sem considerar que, muitas vezes, resolvemos nossos problemas sociais em festas regadas a álcool. Não se pode deixar de considerar que, se o patrão humilha o empregado, nada melhor que um agradinho: um vinho, quem sabe um presentinho para os filhos. Pronto, o dualismo se inverte e o que se via de obscuro se torna límpido.
Creio que acostumamos nossos problemas com nossos vícios, assim como não creio na tese da alienação (por demais discutida e não responde a questão). Vejo, nitidamente, esse comportamento como defesa. Não nos esqueçamos do futebol das sextas-feiras (talvez a única democracia tupiniquim); no meu prédio – sempre em obras - alguns moradores e os trabalhadores se rendem ao esporte nacional e, claro, o álcool está sempre presente. Quando o expediente finda e inicia o espetáculo da liberdade, a necessidade primeira é a de beber até onde o corpo suportar. Naturalmente, sentimos como se o peso nos ombros da responsabilidade de cada um, de transportes coletivos ineficientes, moradias precárias, sobresforço no serviço, tudo é transformado em líquido a arrebatar, a evaporar a realidade, a renovar as forças para marchar e marchar (aonde vamos mesmo?).
A resposta para esse fato não está na alienação. De forma alguma, é límpido que é uma defesa é ali naquele instante que o problema social e as angústias estão sendo discutidas; é naquele instante a dose de rebeldia de cada um é desmascarada. Não é verdade que os mamíferos usam o artifício do álcool nas mais diversas situações? Não usam da amarula (que fermenta no chão e desenvolve propriedades semelhantes às do álcool) num “happy-hour” natural ? (leia mais: http://blog.brasilacademico.com/2009/08/fruta-que-deixa-os-animais-bebados.html) Podemos perceber que o objetivo não é alienar-se, mas sim reduzir o estresse. Em nossa democracia, a alienação é uma condição quase nata, não um objetivo do povo.
Cada qual busca renovar suas forças para continuar no mesmo caminho. O “pão e circo” – onde é permitido – ajuda na garantia da união para manutenção do “status quo” institucionalizado. É fácil notar que a sociedade, por si mesma, estabelece os comportamentos aceitáveis (no caso, naturais) e indica as razões apropriadas.
O analista social afoito grita: como transformar essa fúria dispersante em força concentrada para a mudança social? Eu, de pronto, respondo que a lógica do sistema dominante foi muito astuta e soube racionalizar os espaços possíveis de rebeldia e a massa internalizou esses espaços. A concepção de Estado está solidificada nesse paradigma clássico, o tolerável foi calculado. Analisar, conceituar e refletir o fato histórico é simples; o complicado é vivê-lo e transpassá-lo. Somos rebeldes? Sim, nos espaços permitidos. E nesses espaços, cá entre nós, somos como nenhum outro povo o é! Motivo de orgulho? Não, mas convenhamos: que dá prazer, isso dá.

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Autor: Mauro Soares Carneiro
Formado em História pela Universidade de Brasília, Mauro (24 anos) é Técnico do Tribunal Superior do Trabalho e dedica-se a pensar o Brasil. Questionador nato, não se prende às convenções e busca entender nossa realidade a partir de uma visão moderna e realista.

3 comentários:

  1. Alê obrigadão esse texto foi uma parceria, valeu demais os conselhos técnicos. Eu acho que é por aí, vamos olhar o mesmo objeto sob diferentes prismas porque os vieses tradicionais fracassaram. É um desafio para todos.

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  2. Boas reflexões. Conhecendo o autor e sabendo ser esse mais novo do que eu. Me animo a saber que nem tudo está perdido entre a juventude de rebeldes sem causa. Alguns, como o Mauro, param para pensar o país. Quando li pensei comigo que temos em Lula a síntese do operário explorado. Amante do futebol, dava uma golada na garrafa de pinga que ficava pendurada com o nome de cada operário, antes de voltar ao trabalho (que certamente não era prazeroso). Ou seja, para o bem ou para o mal, temos um presidente que é a cara do povo brasileiro. Assim como o Evo Morales é a cara do povo boliviano. Não sou a favor da bebida alcóolica. Mas sei que para muitos a droga lícita é a forma de tornar a existência mais suportável. Uma válvula de escape. Como diria Chico Buarque: "afinal sem um cigarro, ninguém aguenta esse rojão."

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  3. Essas reflexões são boas, recomendo uma sessão de vídeos no youtube, procure por "Zeitgeist legendado", não fala do Brasil, mais fala de muita coisa omitida.

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